terça-feira, 1 de abril de 2014

Revolta no Inferno

Estou na cidade de Split, na Dalmácia, no sul deste lindo, diversificado e complicado país que é a Croácia. Tudo em função de sua história e por causa da atitude da maioria de seus cidadãos, que teima em varrer certos fatos para debaixo de seus tapetes mais pesados.

Talvez este seja um tema desconhecido para muitos aí do meu Brasil, que não costumam aprender muito sobre o que ocorreu aqui durante a Segunda Guerra Mundial. Mas aqui, na Croácia, se desenrolaram algumas das passagens mais terríveis daquele conflito. Isso, no entanto, ainda é um tabu por aqui. E os croatas evitam ensinar esta História (com agá maiúsculo) às suas crianças.

Mas as vítimas e seus descendentes – comunidade judaica, os sérvios, os gays, os inimigos do regime nacionalista iniciado em 1941 e os ciganos – jamais esquecerão ou deixarão que se apaguem os registros do que ocorreu naqueles anos.

Aqui surgiu um movimento político extremista chamado Ustaše (pronuncia-se “ustáche”) após a ocupação da antiga Iugoslávia pelo Eixo. A Ustaše foi financiada por Hitler e funcionou como um preposto dos grupos de extermínio, cuidando dos campos de concentração e neles usando métodos ainda mais cruéis do que os utilizados pelos alemães nos demais campos da morte.

Hoje eu tive uma oportunidade única, que me foi concedida por um jovem judeu de 93 anos de idade. Isso mesmo, noventa e três anos de idade! Josua Abinum nasceu em 1920, foi preso pelos fascistas croatas e deportado para Jasenovac, um campo de extermínio no qual se matavam prisioneiros com machados, facas e martelos, com os carrascos olhando-os nos olhos.

Este meu novo amigo só escapou de Jasenovac porque fez parte de uma rebelião. Mas isso só depois de ter visto seu pai ser assassinado pela máquina criminosa e tresloucada criada pelos nacionalistas croatas, com a finalidade de "limpar" etnicamente o país.

O mais emocionante do caso em foco é que este judeu, tendo sido um dos poucos (91 pessoas) que escapou com vida do inferno de Jasenovac, foi testemunha em diversos processos movidos pelos novos governos tanto da antiga Iugoslávia, quanto da atual Croácia, tendo fortemente contribuído para colocar na prisão, todos os seus algozes que foram alcançados pela justiça, incluindo-se neste rol, o comandante do campo de morte já citado linhas acima.

Contarei esta história na íntegra, assim como muitas outras, na MENORAH de abril, na nossa edição especial de Pessach, a Páscoa Judaica.

* * *

Mas eu quero falar também de Brasil. E de Rio de Janeiro. Pois escrevo tudo isso às vésperas das eleições que acontecerão tanto no país quanto na Federação Israelita do Estado do Rio de Janeiro (FIERJ). Sempre lembrando que só podemos viver com liberdade em regime democrático.

Um regime democrático é aquele no qual os direitos e os deveres são iguais para todos, sendo o mais importante deles o direito às oportunidades, através da educação, sem exclusões.

Aproveito para lembrar aos "geniais" ideólogos ora existentes na FIERJ que de nada vale uma eleição sem publicidade, sem candidaturas pré-definidas ou sem data marcada e divulgada ao público. Eleições assim acabam esvaziadas, como esvaziadas foram todas as últimas eleições da FIERJ.

O Departamento de Comunicação da Federação está aí para divulgar os candidatos e suas plataformas para que possamos escolhê-los criteriosamente. Já está passando da hora dos "poderosos" cumprirem o seu papel, ao invés de enrolar os judeus do Rio com receitinhas, clipes e colunismo social barato.

Em plena Era da Comunicação Eletrônica, de nada valem as ferramentas que a FIERJ tem nas mãos, se não quer ou não as sabe utilizar.

* * *

Enfim, aguardem pela MENORAH de abril sobre os judeus da Croácia, que vem a ser o país cuja seleção de futebol participará da abertura da Copa do Mundo de junho, enfrentando o Brasil. É um trabalho espetacular que está ficando mais do que fantástico. Será mais uma daquelas edições para guardar e mostrar para a família e para os amigos.

Vale a pena esperar!

* * *

Legenda da foto: Ronaldo Gomlevsky em Split na Croácia, com mais um de seus amigos: o judeu Josuá Abinum, revoltoso e sobrevivente do campo de morte nacionalista croata de Jasenovac.

Ronaldo Gomlevsky

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Os comentários serão moderados, não sendo publicadas ofensas, propaganda racista ou revisionista, ou proselitismo, resguardado o direito de liberdade de expressão. Se vc quiser ofender, crie seu próprio blog. É fácil! Por mais ofensivo que for, nenhum usuário que não tiver seu comentário publicado será considerado como spam ou será bloqueado.